No
programa eleitoral de um Partido concorrente às Eleições Legislativas de 6 de outubro,
pode ler-se:
“Aumentar a Biodiversidade Florestal,
mediante a definição de uma quota não inferior
a 20%, de obrigação de plantação de
espécies de crescimento lento em arborizações
com
espécies de mais rápido crescimento…”
Importa
ter em conta que, no que respeita às espécies de rápido crescimento, há muito
que esta medida tem estado em prática, designadamente na região do Centro. É
comum vermos áreas de eucaliptal polvilhado, em 20% ou mais da sua área, com uma
espécie de crescimento lento, o pinheiro bravo. Mas, mesmo que fosse com
carvalho, há quem assegure a maior combustibilidade deste face ao eucalipto.
Se a
preocupação é “não diabolizar o eucalipto”, existem soluções mais simples.
Em vez
de colocar a fiscalização a avaliar os 20% da área, seria racional apostar em indicadores
financeiros, a avaliar antes de uma validação ou autorização oficial. Aliás,
tendo presente que em 14 dos 18 distritos do Continente a área média dos
prédios rústicos anda pelos 0,57 hectares, 20% em muitos deles pode ser
equivalente a menos de meia dúzia de árvores de crescimento lento.
Porque
não sujeitar os investimentos com espécies de rápido crescimento à satisfação
de valores mínimos em indicadores de cariz financeiro?
Ou,
porque não fazer equivaler os “projetos de florestação” a verdadeiros projetos
de investimento?
Na
verdade, hoje os “projetos de florestação” são uma verdadeira aberração da
engenharia florestal portuguesa. Têm muito pouco de florestal, muito pouco de
investimento racional, nada de análise financeira (nem ambiental, nem social).
De
facto, bastaria a fixação de um valor mínimo para a taxa interna de rentabilidade
(TIR) para tornar racional o investimento com espécies de rápido crescimento. Um
valor para este indicador depende da produtividade expectável, do tipo de
condução cultural a realizar, do custo do dinheiro e do preço esperado para a
venda do produto. Neste caso, da rolaria de eucalipto. Ora, neste último é que
está a questão!
Tudo
leva a crer que esta “não diabolização do eucalipto” passa por manter os mercados
a funcionar em concorrência imperfeita, com os preços da rolaria de eucalipto a
serem definidos unilateralmente pelas celuloses, em posição de domínio comercial
autorizada pela governação.
Pode
ainda querer dizer que continuará a ser permitida a celebração de contratos
leoninos entre as celuloses e as famílias detentores de prédios rústicos,
deixando o “lixo” (eucaliptais com mais de três cortes) para que estas se
livrem deles. O que não tem acontecido, com risco acrescido para o território.
Já iremos acima dos 600 mil hectares de “lixo”, ou seja, cerca de dois terços
da área total estimada de ocupação do eucalipto em Portugal. Só isto justifica
grande parte da miserável produção unitária do eucalipto no país, de cerca de 6
metros cúbicos por hectare e ano.
De
facto, a definição de uma TIR mínima (≥ 7,5%?) para validar ou autorizar
plantações e replantações com espécies de rápido crescimento é uma proposta
muito inconveniente. Mexe muito com a distribuição de dividendos aos acionistas
das celuloses. O problema é que, a sua ausência, entre outros indicadores de
cariz ambiental e social, mexe muito com a delapidação do território, do
recurso solo, do recurso hídrico, do recurso biodiversidade, com o risco para
as populações, seja no risco de vida para as rurais, seja na poluição hídrica e
atmosférica para as urbanas.
Não é
visível neste programa eleitoral, e em vários outros, medidas para intervenção
nestes mais de 600 mil hectares ocupados com eucaliptal com mais de três
cortes. Nestes, são evidentes os sinais de abandono: seja pelo número de varas
por cada pé; seja em cada pé a coexistência de varas queimadas com varas
verdes, seja pela elevada germinação de eucaliptos que surgiu entre pés ardidos
ou para além das áreas de eucaliptal pré-existente. A probabilidade desta área
estar envolvida em futuros grandes e mega incêndios foi já anunciada como
elevada por especialistas estrangeiros (muito antes, já cientistas nacionais
alertavam para o perigo da expansão anacrónica das monoculturas em Portugal).
O
programa eleitoral em questão não foi elaborado por um qualquer Partido político,
o que leva a crer que as portas giratórias entre as celuloses e os cargos de
decisão política se irão perpetuar. Muitos já pagaram o preço, mas muitos
outros o irão pagar, pelo bolso e na pele.
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