quarta-feira, 25 de junho de 2014

O Grupo Portucel Soporcel e o emprego

Em maio de 2012, o grupo Portucel Soporcel anunciava, através do Jornal I, a criação de 15.000 postos de trabalho, com a viabilização, pelo Governo, de 40 mil hectares de eucaliptal. Apareceu, nesse mesmo mês, a proposta inicial do que viria a ser o Decreto-lei n.º 96/2013, de 19 de julho.


Em maio de 2014, o grupo anuncia mais um investimento, agora de 56,3 milhões de euros, dos quais 15 milhões resultam de apoio público, com a criação de 100 postos de trabalho, dos quais 10 diretos.

Todavia, em junho de 2014, o mesmo investimento de 56,3 milhões de euros é de novo anunciado, mas agora com a criação de 300 postos de trabalho, dos quais 10 diretos.

A variação do emprego indireto anunciado em maio e em junho de 2014 é significativo (mais do triplo num só mês), todavia, apesar do empenho do Governo no aumento da área de eucaliptal em Portugal, os números estão ainda muito aquém dos 15.000 postos de trabalho anunciados em maio de 2012.

Os anúncios de 2014 ocorreram na presença do vice-primeiro ministro Paulo Portas, a iniciativa governamental de 2012 partir do Ministério tutelado por Assunção Cristas.

Ficaremos sempre atentos a novos anúncios, "reanúncios" e números envolvidos.

quarta-feira, 18 de junho de 2014

A grande ação



Algumas correções prévias às afirmações da ministra da Agricultura:
  • O setor florestal já representou 3,0% do PIB, mas no ano 2000, em 2010 não passava dos 1,8%;
  • As exportações do setor florestal representam hoje pouco mais de 9% das exportações nacionais, mas já representou 12%;
  • O setor florestal nacional representa hoje menos de 100 mil postos de trabalho, mas no passado já foram diagnosticados 259 mil postos de trabalho.

Assim, mais do que propagandear os números do presente, importa diagnosticar as causas para as quedas registadas face aos números do passado.

Estarão as várias governações a tomar as medidas mais adequadas em matéria de política florestal, de desenvolvimento rural, industrial, ambiental e de ordenamento do território? Pela análise histórica dos vários indicadores disponíveis, parece que não.

Mas, algo mudou nos últimos três anos? Nada, nadinha que mereça o mínimo relevo.

Afirma ainda a ministra da Agricultura que os Portugueses conhecem pouco da riqueza que as florestas podem proporcionar, associando-as geralmente às épocas estivais, aquando dos incêndios florestais. Este é um facto indesmentível, mas o que tem feito a ministra para contrariar este facto?
  • Tem assumido as suas responsabilidades para com aqueles que detêm a esmagadora maioria das superfícies florestais portuguesas?
  • Tem dado o seu contributo para a redução do êxodo rural?
  • Tem assumido posição firme para que sejam ultrapassados os desequilíbrios que há muito têm caraterizado os mercados de produtos florestais?

A mera aposta em ações de propaganda não chega, é preciso mexer nos dossiers difíceis, agitar as águas, pôr em causa os interesses instalados e que têm prejudicado severamente as estatísticas que a ministra tanto gosta de realçar.

É o próprio Ministério da Agricultura que reconhece que, entre 1995 e 2010, as florestas em Portugal registaram uma diminuição da sua área em -4,6%.

O Ministério reconhece ainda que o VAB silvícola em volume registou uma diminuição de 18% em 2011 face ao ano 2000 (média anual -1,8%). Que na evolução do VAB em valor, esta tendência resulta ainda mais acentuada, diminuindo 24,2% na década (média anual de -2,5%), verificando-se, também neste setor, alguma degradação dos preços implícitos no produto.

O Ministério diagnostica ainda que o emprego na silvicultura tem vindo a diminuir na última década: redução de 13,2% de 2000 a 2011 (-1,3% em média anual).

Mais, o Ministério da Agricultura constata ainda que o rendimento do setor, medido pelo rendimento empresarial líquido, tem vindo a diminuir na última década, entre 2000 e 2011, -3,5% em média anual, em resultado da forte degradação dos preços da produção silvícola face ao que se verificou nos preços dos consumos intermédios.

Parece assim que o simples envolvimento de todos não é suficiente. É necessário um envolvimento sério e consequente do próprio Ministério, o inventivo prioritário ao envolvimento dos agricultores, dos proprietários florestais e das populações rurais, designadamente através da contenção do êxodo rural e da criação de condições (equilíbrio dos mercados) para que nas florestas se gerem negócios sustentados economicamente, sustentáveis ambientalmente e socialmente responsáveis.

Os Portugueses já estão demasiado envolvidos nos problemas que o Poder Político não quer, ou não consegue conter. Seja ao assumir os encargos anuais com os incêndios florestais, seja ao contribuir para apoios às florestas que não lhes aportam retorno económico, social ou ambiental, como infelizmente comprovam os resultados obtidos com os apoios da PAC e dos vários OE às florestas nos últimos 28 anos.

Talvez a grande ação a que a ministra faz referência, não seja a grande ação que o país necessita.



domingo, 15 de junho de 2014

O Vice-Primeiro Ministro de Portugal e as Florestas


Num testemunho deixado aquando da sua visita à Feira Nacional de Agricultura, o Vice-Primeiro Ministro de Portugal considera exemplar a gestão em 6% da área  florestal portuguesa. Esta é a área que está na posse de empresas industriais. Mas, será mesmo exemplar essa gestão? Deixemos a caso para mais tarde.

Tratando-se de um testemunho do Vice-Primeiro Ministro de Portugal, deverá admitir-se que os 2% que estão sob a sua alçada (embora indireta), têm seguramente uma adequada gestão florestal. Ou sejam, as Matas Nacionais e os Perímetros Florestais. Mas, será mesmo adequada essa gestão?

Pela mesma ordem de razão, deverá pressupor-se que as áreas baldias em cogestão com o Estado (861, num total de 1107 unidades), indiretamente sob a alçada do Vice-Primeiro Ministro de Portugal, estão a ser adequadamente geridas. Enquadra-se aí uma parte considerável dos 6% de superfícies florestais nacionais na posse de comunidades locais. Mas, será mesmo adequada essa gestão?

Restam os 86% de superfícies florestais privadas, para as quais seria de esperar que, na presente Legislatura, onde o dr. Paulo Portas foi Ministro de Estado e é atualmente o Vice-Primeiro Ministro de Portugal:

- O cadastro rústico tivesse sido concluído e atualizado;

- A regulamentação da Lei de Bases da Política Florestal tivesse finalmente sido concluída;

- O País dispusesse de uma consistente Estratégia Nacional para as Florestas, devidamente compatibilizada com as medidas de apoio financeiro às florestas inseridas no PDR 2020;

- As equipas de sapadores dispusessem dos recursos financeiros em tempo útil para a garantia da sua adequada e oportuna operacionalidade;

- Os agricultores e proprietários florestais fossem o público alvo da política florestal do Estado, onde fossem garantidas condições mínimas para que os seus negócios sejam sustentados, sustentáveis e socialmente responsáveis, sem as limitações impostas por agentes económicos egoístas que atuam a jusante das florestas, egoísmo (extrativismo) esse que tem contado também com a permissão do atual Governo, muito embora o dr. Paulo Portas, seu Vice-Primeiro Ministro, tenha coordenado a elaboração de um guião para a Reforma do Estado, no qual assume que “deve constituir prioridade do Governo precaver e, quando necessário, legislar, para evitar a permanência ou constituição de monopólios”.


quinta-feira, 12 de junho de 2014

Ora cá está, o cúmulo da hipocrisia




Sôtor, a gestão florestal, para além da componente técnica, tem uma componente comercial. Esta última vive nas ruas da amargura.

Sôtor, o Ministério que o seu partido gere há três anos deveria prestar apoio técnico à gestão florestal, juntos dos proprietários florestais, deveria desenvolver medidas de aproximação entre a investigação e a produção, deveria implementar um serviço de extensão florestal, deveria apostar em algo mais do que em puro marketing político. A maioria absoluta de que o governo de que faz parte dispõe, daria para dar um volte face à situação de declínio progressivo das florestas e da atividade florestal em Portugal. Três anos volvidos, constata-se o falhanço.

Sôtor, as empresas a que se refere, com a sua autorização, impõem unilateralmente os preços aos outros produtores, os de cariz familiar, o que impede muitos deles, os com propriedades de menor dimensão, de custearem uma gestão ativa, profissional e desejavelmente sustentável.

Sôtor, as empresas a que se refere são tão boas gestoras que, nos últimos anos, abandonaram dezenas de milhares de hectares (só de eucaliptal foram mais de 30 mil hectares aqueles de que prescindiram). Ou seja, transferiram a sua "boa" gestão para uma gestão incerta ou não gestão.

Sôtor, tenho muitas dúvidas que sejam tão boas gestoras como apregoa. Pedi para visitar algumas das áreas sob sua gestão, até hoje espero autorização. Em causa está a aplicação de resíduos industriais nos solos sob sua gestão. No final do caminho pode estar em causa a saúde pública de populações rurais.

Sôtor, deixe-se de hipocrisia e ponha em prática o que vem na página 60 do "seu" guião Um Estado Melhor (versão de outubro de 2013).

Sôtor tenha consciência de que, ao não querer intervir nos mercados, está a prejudicar a Lavoura e a persistir em manter o ónus dos incêndios florestais nos Contribuintes.

terça-feira, 10 de junho de 2014

É urgente fazer um upgrade

Num evento ocorrido em Santarém no passado dia 9, o secretário de Estado das Florestas identificou os principais problemas das florestas em Portugal. Mas, serão exatamente os que apontou?

Do que apreendi da intervenção do secretário de Estado, tais problemas assentam no abandono e na estrutura da propriedade.

Não sendo usual interpelar um membro do Governo em sessões de abertura e encerramento de eventos, teço aqui alguns comentários sobre a intervenção presenciada.

Quanto ao abandono. Com certeza o secretário de Estado, do decurso da sua formação académica, terá sido beneficiado pelos ensinamentos do Prof. Eugénio de Castro Caldas. Assim, terá percecionado que o abandono, ou a não gestão, corresponde em si a um modelo de gestão. Modelo esse ajustado às expetativas de negócio que tais terras podem potenciar aos seus detentores ou gestores. Sem negócio, não há gestão ativa. Enquanto governante, esperar-se-ía que atuasse em conformidade, gerando condições para que esse negócio possa custear uma gestão ativa, profissional e sustentável das superfícies florestais. Se o vier a conseguir, a Lavoura e os Contribuintes ficar-lhe-ão com certeza muito gratos.

A aposta na repressão fiscal não garantirá negócio, apenas contribuirá para o aumento dos custos associados à atividade silvícola e logo à maior potenciação do abandono. O aumento dos custos tem sido uma constante no tempo, associada ao declínio progressivo da atividade silvícola. Não se passa a fazer uma gestão florestal ativa apenas porque o governo o decreta. Tem de se exigir um pouco mais de empenho aos governantes, se tiverem convicções e competência para tal, bem entendido.

Quanto à estrutura da propriedade. Para um conhecimento atual da realidade, não há como fugir ao cadastro, ou ao parcelário florestal, ou a outro qualquer instrumento que permita ao país identificar e caraterizar convenientemente os donos de 90% das superfícies florestais em Portugal. Como estamos neste domínio? Ainda em comissões ou em projetos-piloto?

Já quase há uma década que andamos em projetos-piloto no cadastro rústico. Pessoalmente, sou radical, ou se faz a nível nacional e de uma só vez, ou continuaremos a encanar a perna à râ. O “nim” não é e nunca será solução de problemas. Qual o desempenho do secretário de Estado neste domínio? O seu antecessor foi muito claro neste domínio, considerando inadmissível que não exista um cadastro da propriedade rústica, afirmando que ser “um falhanço” se o mesmo não for concluído na presente legislatura (4 anos). Assegurará, o atual secretário de Estado, a conclusão atempada do cadastro rústico, ou do parcelário florestal ou lá o que lhe queiram chamar? A Lavoura e os Contribuintes ficar-lhe-iam gratos.

Ainda no domínio da estrutura da propriedade, importa referir que é esta a nossa realidade, que a sua alteração no curto prazo é quase impossível. É esta portanto a base de trabalho para políticos e técnicos. A forma mais viável de atenuar os efeitos menos positivos desta realidade passa pela separação entre a posse e a gestão. Como estamos de reforço jurídico, técnico e financeiro das Zonas de Intervenção Florestal, senhor secretário de Estado? Houve algum desempenho significativo neste domínio do decurso do seu mandato? Sem que se reforce a componente comercial deste instrumento ou de algo mais convincente, jamais se conseguirão resultados significativos.

Importa, senhor secretário de Estado, fazer um upgrade nas suas formulações. O problema das florestas em Portugal vai para além da estrutura da propriedade ou do modelo de gestão florestal mais usual nas superfícies florestais (o designado abandono). Num país com mais de 80% das superfícies florestais na posse de privados, esmagadoramente de famílias, a ausência de rentabilidade nessas superfícies é o nosso principal problema.

Os desequilíbrios nos mercados, onde predomina o egoísmo dos agentes a jusante das florestas, as estratégias industriais extrativistas, condicionam os negócios nos espaços florestais. O que tem feito o secretário de Estado neste domínio? Há real intenção de constituir uma plataforma de acompanhamento dos mercados até final de 2014? Porque não antes? A boa intenção já peca por tardia, mas ficaremos atentos para ver se esta será efetivamente criada e qual a sua composição? A composição determinará a seriedade da boa intenção (das quais o inferno está cheio, como todos sabemos).

No evento o secretário de Estado frisou a disponibilização de apoios públicos à certificação florestal. Ora ai está uma iniciativa que os contribuintes não irão agradecer.

O apoio do Estado à prossecução de uma gestão florestal ativa, profissional e desejavelmente sustentável enquadra-se dentro das suas obrigações, seja através do apoio à investigação, à regulação dos mercados ou à extensão florestal (ou rural), desenvolvidas estas no âmbito dos serviços da Administração Pública, ou por terceiros sob sua supervisão.

Já o apoio por fundos públicos a instrumentos de mercado, como o é a emissão de certificados por entes privados, já parece um abuso. Efetivamente, a comprovação, através de um certificado, da prossecução de uma gestão florestal sustentável, é um ato voluntário, gerador de mais valias nos mercados, que ultrapassam o cumprimento da legislação do Estado. É uma decisão do domínio privado, logo deve permanecer entre os agentes privados.

Em todo o caso, atendendo às caraterísticas das superfícies florestais no domínio público, seria já proveitosa a despesa pública com a certificação das Matas Nacionais. Não só serviria de exemplo aos privados, como aportaria retorno vários à Sociedade. Tanto quanto julgo saber, em tempos estiveram já disponíveis os procedimentos para auditoria. Qual a razão para não se ter avançado neste domínio? Ter-se-á regredido na gestão das matas públicas nos últimos três anos?

Neste mesmo evento, o secretário de Estado insurgiu-se contra quem diz mal das florestas. Pessoalmente não me revejo nesse grupo, considero aliás que Portugal tem um enorme potencial neste domínio, seja no plano económico, seja no social e ambiental. Todavia, asseguro a minha presença ativa no grupo daqueles que fazem frente á incompetência, seja no plano político, seja no técnico, bem como daqueles que se opõem a uma visão interesseira e de curto prazo na utilização dos recursos florestais nacionais. Porventura, será isso que nos separa, senhor secretário de Estado?

Nota final: Quanto á alegação, pelo secretário de Estado das Florestas, da inovadora forte presença do setor florestal este ano na Feira Nacional de Agricultura, não lhe reconheço conhecimento histórico suficiente para tal afirmação. Já o teve mais no passado, envolvendo inclusive o grande auditório do CNEMA, não apenas a sala Tejo.