O novo Programa de
Desenvolvimento Rural (PDR 2020), a vigora entre 2014 e 2020, apresenta um
pacote “3 em 1” para os negócios privados da certificação florestal.
Todos nós devemos
apostar na viabilidade técnica e comercial de uma gestão florestal que se quer ativa,
profissional e sustentável. A Sociedade só ganha.
O governo, pelas
obrigações que lhe competem, deveria ser o primeiro a promover as condições
necessárias para o salutar funcionamento dos mercados, condições essas que permitam
gerar a sustentação económica, a sustentabilidade ambiental e a responsabilidade
social na atividade silvícola. Ora, neste domínio, a sua ação tem sido a de
proteger negócios financeiros de grupos industriais. O famigerado Decreto-lei
n.º 96/2013, de 19 de julho, é disso um exemplo acabado Não lhe importam os desequilíbrios
existentes entre a oferta e a procura, importa sim garantir matéria prima
suficiente à indústria a preços permanentemente baixos. Os resultados desta
estratégia política são bem conhecidos, sobretudo nos períodos estivais. A
Sociedade assume os encargos.
Deveria ainda o
governo criar os mecanismos que permitam apoiar, no plano técnico e também no
comercial, os detentores dos espaços florestais nacionais, sabendo que na sua
esmagadora maioria estes são detidos por famílias. Aqui não bastam os apoios
financeiros do PDR 2020, há que criar e dar estabilidade (pós-2020) a um serviço
de extensão florestal, que ligue a investigação aplicada aos produtores
florestais. Obviamente que, no decurso deste apoio técnico e comercial, a
produção adquirira maior poder negocial junto da indústria. Isso pode não ser
conveniente. Mas, seria conveniente para a Sociedade.
Mais, compete ao
governo fiscalizar, em especial no que respeita aos apoios públicos que tem
conferido e conferirá ao investimento de privados nas florestas, se os
compromissos subsequentes, quanto a uma gestão ativa, profissional e
sustentável de tais investimentos, são garantidos ao longo de todo o ciclo
produtivo florestal. Ou seja, deveria acompanhar o funcionamento dos mercados,
o único meio de garantir, apesar dos apoios públicos às florestas, a obtenção
de retorno dos investimentos nelas realizados. Esse acompanhamento, ou mesmo a
regulação dos mercados, é inconveniente para os negócios financeiros associados
a alguns grupos industriais de base florestal. O histórico daí decorrente evidencia
riscos elevadíssimos, facilmente reconhecíveis em cada período estival. A Sociedade
assume os encargos.
Todavia, no PDR 2020,
parece que o governo quer continuar a beneficiar negócios financeiros de alguma
indústria, mais uma vez com o apoio dos contribuintes. Pretende o governo financiar,
através de despesa pública, sistemas privados, autorregulados, com vista à
obtenção de mais valias nas vendas dos produtos transformados, de preferência
sem que essas mais valias se espelhem na produção florestal. Todavia, para não
se espelharem na produção, terão de ser os contribuintes a financiar estes
sistemas privados.
A certificação
florestal assenta em sistemas privados, de adesão voluntária, de comprovação da
gestão florestal sustentável. Os sistemas partem do princípio de que os bens e
serviços objeto de certificado serão valorizados pelos mercados, em última
instância pelos consumidores. O diferencial de preço de um produto ou serviço
objeto de certificação, garantindo que no todo ou numa percentagem este é
obtido a partir de área florestal sujeita a uma gestão sustentável, deveria ser
repercutido ao longo de toda a cadeia produtiva. Ora, com o apoio que o governo
vier a conceder á certificação florestal, através do PDR 2020, este princípio é
subvertido, chamando os contribuintes a pagá-lo na parte financiada.
Assim, as entidades privadas,
associadas aos sistemas de certificação florestal, veem garantido o seu
negócio, negócio que se deveria suster apenas pelo funcionamento dos mercados,
não pela realização de despesa pública.
No PDR 2020, o governo não financia
apenas a certificação florestal (1), nos seus encargos técnicos e administrativos,
prioriza investimentos que se enquadrem em áreas certificadas (2) e majora os
apoios, através de subsídio não reembolsável. a projetos a concretizar nas
mesmas (3). Ou seja, paga parte, prioriza e majora. Estão assim garantidos,
pelos contribuintes, os negócios das entidades relacionadas com os sistemas de
certificação do FSC (Forest Stewardship Council) e do PEFC (Programme for the
Endorsement of Forest Certification). Bom negócio.
Não que se conteste a prioridade a
investimentos em áreas certificadas, ou mesmo a majoração de 10%, através de
subsídio não reembolsável, no financiamento público a projetos baseados em
áreas com certificação florestal, agora financiar um negócio privado,
autorregulado, apenas para diminuir custos da indústria, transformado esse
custo em benefício financeiro, é que não parece aceitável.
Mas, serão estes sistemas privados,
autorregulados, credíveis? Importa averiguar diretamente.