quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Nas florestas não se vislumbra reforma, será que a “reforma” do governo deve ser lida nas entrelinhas?

Logo à partida, merece destaque um événement parallele anunciado pelo Primeiro Ministro, o estabelecimento de uma parceria público privado de sustentação, pelo Orçamento, de um negócio privado estabelecido entre uma oferta em perda e uma procura protegida pelo regime.

Com efeito, a intervenção pública, anunciada em 18 milhões de euros para a fileira papeleira, parece decorrer de uma necessidade dos contribuintes terem se socorrer os grupos industrias deste sector. Isto face a uma posição prepotente destes últimos e, perante isso, do sinal de desprezo demonstrado pela oferta. Não parece haver outra justificação, face ao protegido duopólio industrial, para a resposta ao tipo de gestão das plantações de eucalipto em Portugal, onde se evidenciam extensas áreas em que o coberto, a densidade e a idade dessas plantações não condizem com uma gestão ativa, profissional e sustentável. Sinal dessa gestão de risco é a incidência dos incêndios sobre tais plantações que, em 2017, atingiram uma fasquia na ordem dos 70% do total de áreas ardidas em povoamentos florestais (considerando aqui que as plantações com esta espécie exótica invasora se enquadram no conceito de povoamento florestal, nem todos as reconhecem assim).


Na “reforma” propriamente dita e nos anúncios públicos do ministro da Agricultura, tudo parece apontar para aposta em negócios bio: de bioenergia e de biocombustíveis.

Será que a “reforma”, nas entrelinhas, se traduzirá em mais negócios fabris “justificados” na utilização de resíduos de biomassa florestal residual? Esta é já uma velha “luta”, mas os resultados têm sido desastrosos.

No caso da bioenergia, como serão ajustados tais negócios com os custos de concentração, extração e transporte de resíduos de biomassa florestal residual? Decorrerão de mais um apelo aos contribuintes, ou serão os consumidores a sofrer um agravamento dos custos de energia? Importa esclarecer!

Quer na aposta em bioenergia, quer em biocombustíveis, esta última outra história antiga e de resultados pífios, quais os modelos de exploração a adotar em tais negócios que garantam um não agravamento da delapidação dos solos, bem como de não agravamento ou mesmo de combate à desflorestação?

Até hoje, a justificação de valorização de resíduos de biomassa florestal residual tem-se traduzido numa gestão de muito duvidosa sustentabilidade dos espaços florestais.

Servirão tais negócios para continuar a “erradicar” áreas de produção de lenho, sobretudo de pinhal? É que não se vislumbram investimentos de melhoria da gestão ou de reflorestação das áreas abrangidas pela valorização de resíduos de biomassa florestal residual, nem da parte da oferta, muito menos da procura por tal “matéria prima”.

O negócio dos biocombustíveis, de acordo com o histórico em Portugal, não constituirá mais um negócio de mera captação de fundos públicos para estudos e projetos piloto? Existem estudos de viabilidade técnica (sobretudo na componente florestal) e financeira que possam ser tornados públicos? Basear um negócio neste domínio na justificação de valorização de resíduos de biomassa florestal residual é muito curto, demasiado curto. Não haverá troncos à mistura nas necessidades de abastecimento fabril?

Para já, esta aposta bio suscita, isso sim, elevados e justificados receios de agravamento da desflorestação em Portugal. Esta situação de desflorestação, caso único na União Europeia, para além de nos dever envergonhar, deveria sobretudo gerar uma elevada preocupação face às graves perspetivas de incidência das alterações climáticas no país. Neste domínio, tudo indica que vamos precisar de mais árvores, de mais e melhores florestas, não de desflorestação.

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