terça-feira, 20 de dezembro de 2016

O histórico de “reformas” e “consensos” nas florestas

Na altura em que o Ministro Capoulas Santos apela a um amplo consenso em torno da sua “reforma das florestas”, importa ter em conta o passado recente.

Iniciemos uma breve análise por 1992, com o Projeto Porter e os “clusters” da gestão florestal e das indústrias da madeira. Face ao guru da Estratégia Empresarial, que propunha reformas significativas, até se gerou algum consenso… de curta duração.

Em 1995, as mais representativas organizações das fileiras florestais reuniram no Grande Hotel do Buçaco, em contestação ao desinteresse por parte do Governo de então sobre as florestas e as indústrias florestais. Exigiu-se até um Alto Comissário, na dependência do Primeiro Ministro. Foi criado um Conselho Interprofissional das Florestas. Serviu este empenho para o passo seguinte.

Em 1996, as Forças Políticas e a quase totalidade das organizações do sector, se é que não foram todas, envolveram-se na elaboração e posterior aprovação, por unanimidade no Parlamento, da Lei de Bases da Politica Florestal. De então a esta parte muita estória correu, a desflorestação agravou-se. O consenso sofreu de amnésia.

Em 2004, na sequência dos incêndios de 2013, o Parlamento discute em Janeiro desse ano a “reforma da floresta”. Deu-se consistência legal ao fundo florestal permanente e criaram-se as zonas de intervenção florestal. O consenso gerado leva a questionar se o fundo em causa teve impacto na luta contra a desflorestação. Quanto às zonas de intervenção florestal, de então a está parte, é notória a sua dependência dos ciclos políticos, com um histórico em “nim”, nem não, mas também nem sim.

Em 2006, surge um esforço na regulamentação da Lei de Bases (10 anos após a sua aprovação), com a elaboração dos planos regionais de ordenamento florestal. Curiosamente, as suas metas foram suspensas no Governo seguinte, muito embora ambos os Executivos partilhassem o mesmo Primeiro Ministro.

Nesse ano, no decurso de um Governo do Partido Socialista, foi igualmente aprovada a Estratégia Florestal Nacional. Independentemente das suas inconsistências, a mesma foi atualizada em 2012, desta vez no decurso de um Governo do Partido Social Democrata e do Partido Popular. Foi na altura evidenciado mais um consenso, pelo menos ao nível do designado arco da governação.


Mas, eis que em 2016 surge uma nova “reforma da floresta” e se apela a mais um consenso, amplo. Pelo caminho não se percebe como se enquadra esta sugestão de consenso nas anteriores versões de consenso: na Lei de Bases, no que quanto a esta se pretende fazer; bem como na Estratégia Florestal Nacional. Afinal de contas, qual a relação entre a "reforma" de Capoulas Santos e a Estratégia? Será esta última para engavetar?

No essencial, o que importa salientar é a ausência de uma visão de médio e longo prazo, vai-se recorrendo a uma navegação à vista, todavia, em fase de crescente desflorestação. 

No essencial, as causas do problema são sistematicamente ignoradas, insistindo-se em abordar os problemas pelos efeitos e, sobretudo, pelas suas consequências. As “reformas” surgem sistematicamente desenquadradas de um incontido êxodo rural e dos fatores que o alimentam. Mas, afinal, para que servirá o consenso desta vez? Na sua base estão as inconsistências de sempre, o querer completar um puzzle apenas com parte das peças.

Factos! Desde 1992, quando se iniciou a presente análise, necessariamente breve e com os riscos desse facto, Portugal tem assumido um crescente destaque, no plano europeu e mundial, no que respeita à desflorestação.

Torna-se evidente, aos olhos do mundo, que os objetivos traçados na Lei de Bases estão em causa, o que coloca em causa a credibilidade da politica florestal nacional e, assim, a sustentabilidade dos recursos florestais nacionais.

O presente apelo ao consenso, amplo, perante este histórico, não pode ser classificado de outra forma: trata-se de pura e irresponsável demagogia!


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