segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Desabafo estratégico.

A incapacidade técnica e política de definir e concretizar uma estratégia nacional, consistente e duradoura, baseada nas racionais e sustentáveis expectativas das pessoas e que não passe apenas por relações win-loose (tão do agrado de alguma indústria), onde o loose está nas florestas e nos contribuintes, tem constituído o principal problema das florestas em Portugal.

O País é caracterizado por um regime democrático, desde 1974, com uma economia aberta e onde, caso impar a nível mundial, a quase totalidade dos espaços agroflorestais e silvestres é pertença de entes privados, esmagadoramente por famílias, mas também por comunidades rurais (nos baldios) e por empresas. Ostracizar estas entidades é o primeiro passo para o fracasso de qualquer política de desenvolvimento rural, logo também para a concretização de medidas e instrumentos de política florestal. Mas, andamos nisto há décadas. Os desastrosos resultados obtidos são disso um efeito, com consequências no despovoamento e na desertificação das regiões rurais.

Neste contexto, a Estratégia Nacional para as Florestas, em fase de avaliação, é em si uma não estratégia, plena que está de inconsistências fatais. Não passa de uma resma de papel de “boas intenções” (apregoadas por conhecidos técnicos e políticos).

Num País com a quase totalidade dos espaços agroflorestais e silvestres detidos por privados, não pode uma Estratégia ser definida em função do eucalipto, do pinheiro bravo, do sobreiro ou das demais, tem de ter por base os Silva, os Esteves, os Coelho, os Seguro, os Portas e os muitos outros que são donos, herdeiros, arrendatários ou gestores destes espaços. Os políticos, os académicos e os tecnocratas têm de saber lidar e acolher as expectativas (se ainda existem) das pessoas. É certo que, como as árvores não se exprimem, são aparentemente mais facilmente “domesticáveis” às doutrinas académicas e técnicas que têm vigorado no País.

Uma Estratégia não pode enunciar e realçar as consequências, ou sejam os incêndios, as pragas e doenças, e os efeitos, ou seja a ausência de gestão ativa das florestas, sem destacar a causa do problema florestal português: a ausência de expectativas de rentabilidade da maioria dos solos do País. Expectativas essas baseadas no uso sustentável dos recursos naturais, inseridos nos princípios da Economia Verde e tendo por base, não só a produção de bens, mas também a prestação de serviços, tenham eles hoje valor de mercado, ou seja ainda intangíveis (como muitos dos serviços ambientais que todavia a Sociedade tem de pagar).

Uma Estratégia tem de ter um plano de investimento e um plano de financiamento, caso contrário, onde se sustenta uma decisão política consistente? As que temos tido têm os resultados á vista (capa do jornal Público de 18/08/2013). Afinal de contas, os contribuintes com a atribuição de fundos públicos, constituídos com base nos seus impostos, para o fomento das florestas, tem acabado involuntariamente por financiar os incêndios florestais em Portugal. É simples, se numa área florestal, constituída por fundos públicos ou privados, não estiver assegurada (contratualmente) a sua gestão/administração, de acordo com princípios técnicos, mas também com a aplicação de métodos comerciais, o risco de arder é, como hoje se sabe, muito substancial (é apenas uma questão climatérica mais ou menos favorável).

Por fim, uma Estratégia tem, em regime democrático, de contribuir para aproximar os ciclos eleitorais (de 5 anos) dos ciclos florestais (de várias décadas), como acontece nos países mais desenvolvidos da Europa, não se pode permitir ao presidente executivo da Portucel afirmar que o ciclo eleitoral é “o maior inimigo” da floresta em Portugal (Lusa, 20/11/2012, 16:24). Isto é inadmissível.