segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Mas que hipocrisia!

Antes de mais, por alguma experiência que tive no planeamento e na operacionalização deste tipo de eventos, importa reconhecer que coordenar 600 participantes numa ação de plantação de 20 mil árvores na serra do Caramulo, como aconteceu no passado dia 18, não é para qualquer um. Estão de parabéns os organizadores.

Em todo o caso este não é um espaço para louvores. É sim deliberadamente um espaço de denúncia e contestação.

A ministra da Agricultura associou-se à iniciativa, mas não haverá nisso uma evidência de hipocrisia?


Em causa esteve a plantação, por voluntários de 20 plantas de espécies autóctones. Todavia, com um simples diploma anunciado desde maio de 2012, a ministra está a incentivar a plantação de 40 mil hectares com uma espécie exótica. Considerando uma média de 1.200 árvores por hectare, falamos de 48 milhões de eucaliptos, ou seja 2.400 vezes o que foi agora plantado no Caramulo.

Não, o presente argumentário não é xenófobo. Não é contra o eucalipto. Nem é sequer contra a monocultura. Mas, é seguramente contra a monocultura de risco. Aquela que a ministra pretende disseminar pelo minifúndio, sem garantias de rentabilidade aos produtores, logo de gestão florestal duvidosa, que mais não serve como garantia de preços baixos, à perpetuidade, à indústria papeleira, a que encomendou o diploma à ministra em anúncio público de maio de 2012, a mesma a quem a ministra garante proteção, permitindo que os mercados funcionem em concorrência imperfeita.

Se em 2003 a receita da venda de 1 m3 de rolaria de eucalipto permitia a aquisição de 107 litros de gasóleo agrícola, em 2011 apenas permitia a compra de 55 litros.

Ou seja, a ministra nem defende a lavoura, sabe do desequilíbrio nos mercados e não atua, pior vende falsas rentabilidades; nem é amiga dos contribuintes, os que terão de pagar os desaires desta estratégia. Os incêndios florestais produzem avultados encargos sociais, ambientais e económicos ao País. Lembrar-nos-emos disso incansavelmente em 2015.

Importa contudo esclarecer a ministra e os mais desatentos que, o esforço que realizou na plantação de uma árvore é um passo simples e com um grau de dificuldade mínimo face ao que se segue. As dificuldades para os proprietários florestais começam aí, mas agravam-se depois ao longo do ciclo de explorabilidade da árvore. Desde logo, com as inconsistentes e inconsequentes políticas, com os aumentos dos encargos nos consumos intermédios, com o decréscimo dos rendimentos, com os elevados riscos que estão longe de ser contidos, com a postura egocêntrica dos negócios financeiros na indústria, com a proteção desta pela governação.

Ou seja, aparece a ministra para a fotografia a plantar uma árvore de espécie autóctone, mas na realidade fomenta a monocultura de risco.


(Título do Jornal I de 15 de maio de 2012)

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